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Haddad tem sim uma doença, eu acho, mas ultimamente dava sinais de franca recuperação. Agora, uma recaída inesperada. O quadro patológico de Haddad ainda não recebeu um nome. Talvez muitos tenham a mesma enfermidade, mas só nele tudo se manifesta em grau assustador.

Esquizofrenia não é. Haddad não tem múltiplas personalidades. Perda de memória, um tipo de começo de Alzheimer? Não! Uma confusão mental advinda de um quadro pós-pandemia? Ah, isso é vago! Não sei como lidar com essa coisa toda. Mas talvez só nós, filósofos, possamos de fato dizer do que se trata. Os médicos não vão achar nada. A situação é exatamente esta: Haddad sabe perfeitamente quem é, mas ao escrever ele se funde com o Lula e, em determinados momentos, morre em vida, no texto, para que Lula reine. Quando terminamos o seu texto, fica claro que ele se fundiu ao Lula, ele é o Lula, mas não como incorporação e sim com uma abstenção de si mesmo, uma vez que Lula está lá, levando-o para o ostracismo.

Haddad vinha se tornando Haddad. Lula reapareceu como candidato e Haddad perdeu o chão.

O artigo de que falo tem o título “Soberania e integração” (Folha 12/09/2020). Haddad comenta um texto da jornalista Ângela Alonso. Ela havia comparado discursos de Bolsonaro e Lula. Haddad segue nessa trilha. E continua falando de Lula e, claro, de Bolsonaro. Mas Lula é o tema central do texto. Diz então que as “elites” optaram por tudo que era tosco, ou seja, o Bolsonaro, e deixaram de lado o projeto melhor.  Esse projeto melhor, para vingar, deveria ter contado com a escolha por parte das elites, na última eleição, “de um estadista”. Ou seja, Lula deveria ter sido o escolhido. Todavia, como sem dúvida tem que lembrar,  o candidato contra Bolsonaro não foi Lula, e sim ele próprio, Haddad!

É como se Haddad, em meio ao artigo, tivesse se esquecido de que ele era o candidato e, louvando Lula, termina o texto totalmente subsumido à figura do chefe, herói e ídolo – Lula. Ou como se ele estivesse confessando: sim, eu sei que o candidato fui eu, mas eu iria apenas obedecer Lula. Eu não iria querer fazer coisas sem consultar, como Dilma. Agora seria diferente!

A subserviência de Haddad, agora que Lula voltou à cena em discurso oficial de candidato – mesmo ainda não podendo sê-lo -, surge como que num quadro patológico! Que doença é essa que Haddad expõe em sua própria pele?

Todavia, e se tudo isso não for um grande jogo de inteligência de Haddad? E se o artigo não foi escrito para nós, e sim única e exclusivamente para o Lula? Provido de uma sagacidade mordaz, Haddad estaria apenas se vingando de Lula e dizendo: tudo que Lula falou e que só pode ser realizado por um estadista, foi deixado de lado pelas “elites”, uma vez que não votaram no estadista, e este estadista não é este meu herói que comento aqui, mas o homem de carne e osso que realmente estava no pleito – eu mesmo, Fernando Haddad.

Se o caso é este, então, Haddad não estaria doente. Ele estaria bem sadio. Seu recado seria o de, sutil e ironicamente avisar Lula de algo que ele próprio, Haddad, preza demais, e que Lula não possui: a capacidade de ser grato. Seria uma estocada em Lula: olha, companheiro, você ressurgiu agora e quer me colocar para escanteio, mas eu sou o estadista da campanha, não você – não se lembra mais de mim né? Fui eu quem aguentou o tranco da campanha, e eu adquiri independência.

Não descarto de todo essa hipótese de leitura do texto de Haddad. Se assim é, Haddad deveria ultrapassar o limite da ironia sutil e firmar posição, dizendo algo claro: ainda sou o candidato, como eu era a uma semana atrás, antes de você fazer esse discurso de Sete de Setembro, completamente egocêntrico. Haddad faria ainda melhor se, para arrematar, dissesse: comigo não violão, eu não sou o Ciro! Não vou fazer biquinho, vou me diferenciar aqui mesmo, dentro do partido.

Será que estou idealizando demais esse Haddad que estaria descolando de Lula? Qual leitura correta? Esta última, de um Haddad semi-vingativo (com direito), ou a primeira, de um Haddad cometido de uma doença em que ele se entende como um corpo que Lula habita quando quer?

O “torna o que tu és” de Nietzsche não tem cabimento para Haddad? Será que vai se tornar velho sem nunca ter podido ser outra coisa que um pau mandado? Até que ponto um homem deve levar a gratidão à auto-anulação?

© 12/09/2020 Paulo Ghiraldelli, 63, filósofo[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]